Instituto Soka Amazônia

Natureza como aprendizado, a lição do povo Kambeba

Instituto Soka Amazônia conversou com gestor da Escola Indígena Kanata, professor Raimundo Kambeba, sobre a experiência da educação intercultural
Raimundo Kambeba, gestor da Escola Indígena Kanata

Neste mês em que se comemora o Dia Mundial da Educação Ambiental*, o blog do Instituto Soka Amazônia compartilha entrevista especial com o educador Raimundo Kambeba, gestor da Escola Indígena Kanata.

Graduado em Pedagogia Territorial Indígena pela Universidade Estadual do Amazonas (UEA) e Mestre em Educação, pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Raimundo Kambeba fala da experiência da educação indígena para preservação da natureza e da identidade do seu povo.

Mas, quem são os Kambeba?

Também chamados de Omágua, ou povo das águas, os Kambeba são conhecidos por suas canoas, resistentes e de navegação eficiente.

Presentes também no Peru, há muito tempo deixaram de ali se identificar como indígenas devido à violência e à discriminação que existe desde o século XVIII por parte de não indígenas. Outra característica que os diferenciava de outros povos indígenas, eram suas vestimentas em algodão[i].

*26 de Janeiro

Dia Mundial da Educação Ambiental

Data instituída na Carta de Belgrado, em 1975, elaborada durante o Seminário Internacional sobre Educação Ambiental, com o objetivo de conscientizar sobre a necessidade de proteger o meio ambiente através da educação.

Na Amazônia brasileira, os Kambeba estão localizados nas regiões do alto Solimões e baixo Rio Negro.  Na cidade de Manaus, a comunidade Kambeba está estabelecida na região Três Unidas, cerca de um quilômetro da capital em linha reta

De acordo com o professor Raimundo, esse grupo veio do alto Solimões até o baixo Rio Negro em busca de melhores condições de vida, de educação, saúde, economia e organização social.

Fonte: Site Povos Indígenas do Brasil/Instituto Socioambiental

Nos últimos anos, a comunidade Kambeba de Três Unidas vem estabelecendo parcerias, entre as quais plantio de mudas com o Instituto Soka Amazônia, com o enfoque na saúde, educação intercultural, e economia voltada à interculturalidade.

As parcerias, segundo o professor Raimundo, auxiliam na conquista da melhoria da qualidade de vida para a comunidade e nas condições de preservação do ambiente em que habitam. E ressalta: nessa questão é fundamental que se conheça a economia indígena e a economia não indígena.

Comunidade Kambeba e Escola Indígena Kanata.

Aprendendo com a natureza

“Para nós, povos indígenas, a Natureza é nossa mãe. A Terra é a nossa mãe, é onde a gente vive, é onde a gente está no dia a dia. É ela que nos dá saúde, oxigênio limpo de qualidade para a gente viver. Então, é a luta que nós, povos indígenas temos”, explicou professor Raimundo.

Na escola indígena, o respeito ao conhecimento dos mais velhos é valorizado como forma de preservar sua cultura. As crianças aprendem sobre o conhecimento ancestral e tradições, como as danças, músicas e gastronomia indígenas, além da arte do seu povo, como as pinturas, produção de peneira e outros utensílios de caça e pesca. Todo esse aprendizado é realizado na escola indígena, sendo os mais velhos os professores e especialistas no conhecimento.

Trajetória como educador

Raimundo Kambeba começou a atuar como professor aos 14 anos de idade. “A comunidade me apoiou para ser professor. Eu tinha estudado até a 5ª série. Comecei a estudar e dar aula. Mas, por eu ser menor de idade, a Secretaria de Educação, daquela época, não aceitaria me contratar.  Assim, meu pai foi contratado e eu trabalhava com ele, dando aula”, contou.

Raimundo relembra que, no início, eram 30 crianças para alfabetizar e ele só tinha uma ideia: valorizar a cultura de seu povo, revitalizar essa cultura, reavivar a língua, imortalizar os conhecimentos tradicionais.

(*) Tuxawa é uma liderança política dos povos indígenas. Do tupi, o termo tuxaua significa “aquele que manda”. Seria o que, em português, é conhecido como cacique.

Nesse percurso, por ser indígena, ele sofreu discriminações, mas a cada desafio renovava sua determinação e os obstáculos só serviram para que se fortalecesse mais e mais.

Hoje, 29 anos depois daquela primeira turma de 30 alunos, Raimundo é o vice tuxawa* reconhecido e querido pela comunidade, onde atua com seu pai.

“É uma luta muito grande que a gente tem como povos indígenas, de estar conseguindo lidar com todas essas situações. Nós somos as lideranças e buscamos por dias melhores para os povos indígenas”, diz Raimundo.

Educação intercultural

O acadêmico e professor, Raimundo Kambeba, ressalta a importância das parcerias com instituições que valorizam a interculturalidade, compreendendo as diferenças entre os indígenas e não indígenas como possibilidade de enriquecer ambas as culturas.

Para ele, é importante conhecer o que é educação indígena e o que é educação escolar não indígena. “O que é cuidar da natureza para o índio? O que é cuidar da natureza para o não indígena? O que a saúde indígena propõe para os povos indígenas e o que a saúde não indígena propõe para os não-índios. Até os governantes também”, enfatizou.

Todas essas reflexões fazem com que os povos originários se fortaleçam em conhecimentos e sabedoria; as parcerias contribuem para que essas etnias busquem maior autonomia e obtenham melhoria na qualidade de vida em suas comunidades.

Os Kambebas são uma das mais expressivas etnias a se projetar rumo a um futuro em que indígenas e não indígenas possam compartilhar espaços e saberes como irmãos, membros de uma mesma família humana.

Ao longo de 2023 teremos oportunidade de publicar neste blog uma série de matérias abordando diferentes aspectos do povo Kambeba. Acompanhe e nos siga nas redes sociais.


 

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