A história de Rodrigo, o jovem engenheiro paranaense que morava no Japão com a família, conheceu o conceito Bom-Belo-Benefício, decidiu voltar sozinho ao Brasil, estudou e hoje faz parte das expedições que se embrenham na mata em busca de árvores-matrizes e sementes
O mundo dá muitas e muitas voltas e o caso do Rodrigo Yuiti Izumi comprova isso.
Engenheiro Ambiental, 33 anos de idade, ele hoje faz parte ativa (muito ativa) da equipe do Instituto Soka da Amazônia, e uma das suas funções é participar das expedições que entram floresta adentro em busca de sementes e árvores-matrizes.
Paulista de nascimento, mas criado no Paraná, quando adolescente foi com a família para o Japão em 2003 e tinha tudo para fazer lá a sua vida. Estudava, conseguia se comunicar bastante bem em japonês, vivia bem com a família, mais adiante começou a trabalhar, não ganhava mal, tinha tudo para não voltar ao Brasil.
Mas voltou.
Voltou até com uma decisão profissional assumida, alguma atividade relacionada a ambientalismo.
Contribuiu para essa tomada de decisão a leitura das publicações do Soka Gakkai que os pais recebiam em casa, onde leu, por exemplo e com interesse que acabou marcando para sempre a sua vida, o conceito “Belo, Benefício, Bom” de autoria do primeiro presidente da Soka Gakkai, Tsunesaburo Makiguchi. Essa teoria, aplicada ao trabalho, é um excelente critério para a escolha de um bom emprego. O valor do belo significa encontrar um trabalho do qual a pessoa goste; o valor do benefício é conseguir um emprego que proporcione um salário com o qual ela possa se sustentar; e o e o valor do bem significa encontrar um emprego que ajude os outros e ao mesmo tempo contribua para a sociedade.
E foi com decisão tomada que desembarcou de volta no Paraná com uma poupança capaz de mantê-lo enquanto estudava: completar o estudo básico interrompido quando saiu do Brasil, um ano de preparatório e 4 anos na Universidade Federal do Paraná.
O curso, Engenharia Ambiental, não era exatamente o que tinha imaginado, em verdade um curso que não existia e não existe, para formação específica de um ambientalista.
“Aliás – conta Rodrigo – a decisão de estudar, foi a partir do choque com a realidade da maior parte dos meus amigos brasileiros da minha faixa etária, 19 anos em 2007, que, terminada a formação no ensino médio entrava no mercado de trabalho e ganhava um salário mínimo, um sexto do que eu ganhava no Japão”.
Conclusão: se quisesse encontrar o emprego dentro do critério Belo, Benefício, Bom, teria que estudar.
E foi o que fez.
Já formado, através de um amigo comum, conheceu o sr. Edison Akira, presidente do Instituto Soka da Amazônia e começou uma troca de e-mails, conferências pelo hangout e, em 2017, uma visita a Manaus. Em 2019, aberta pelo ISA uma seleção de profissionais, acabou sendo contratado e estava definida a carreira profissional do jovem engenheiro ambientalista paranaense.
Expedições: o que vem antes
Antes de uma expedição à mata para a coleta de sementes e identificação/cadastramento de árvores matrizes, todo o planejamento exposto em outra matéria neste espaço: estudo da genética das árvores, tipos de solos, potencial das espécies coletáveis, valores ambientais próprios de cada espécie e tudo o mais.
As expedições
À beira da floresta como está o Instituto Soka da Amazônia, as expedições são realizadas normalmente em um dia de trabalho, um dia que começa muito cedo, pelas 5 da manhã e termina no mesmo dia, com o sol se pondo ou já noite fechada.
Os grupos são de 3 a 7 pessoas, cada um com sua própria função.
Chegar cedo, mas, cuidado, não cedo demais
Numa dessas excursões, como Rodrigo conta, a maratona começou com pequeno percurso de carro, em seguida 25 quilômetros e duas horas de barco a motor rio a baixo pelo Rio Negro, troca de barco por uma canoa a remo, caminhadas, abertura de trilhas, todos os muitos cuidados tomados e chegada ao destino não muito cedo.
“Há animais, que afinal são os “donos” da floresta, e podem ser agressivos dependendo do horário em que os forasteiros aparecem” – diz Rodrigo.
As canoas são necessárias para ganhar tempo e atingir o mais rapidamente possível os locais de coleta das sementes. O rio por onde entravam na mata era muito sinuoso e o barqueiro do barco a motor seguiu adiante, dando voltas e voltas, para resgatar a expedição mais tarde, enquanto a equipe, graças aos atalhos, começou antes o trabalho que a trouxe para o meio da mata.
Tanta água, muita sede
O dia cheio de atividade, o trabalho só é interrompido para um lanche rápido – sanduiches que saíram prontos de Manaus.
“O problema de matar a fome não seria problema, sempre há algo pra se comer e, de qualquer forma ninguém chega a morrer por um dia de fome, mas passar sede é que é complicado” conta Rodrigo, a respeito de uma expedição em que a ração de água foi mal calculada e a sede apertou. “Mas os “mateiros” (espécie de guias naturais da região) não tiveram problema para cortar alguns cipós e tirar de dentro deles água fresquinha”.
O trabalho
As expedições normalmente têm duas etapas. A primeira de reconhecimento do local, entendimentos com pessoas que vivem nos povoados dentro da mata, localização de áreas com potenciais matrizes, preparação, enfim, para planejar a logística das expedições de coleta.
As sementes, dependendo das árvores, podem ser minúsculas, do tamanho de um grão de pimenta do reino, outras vezes bem grandes, do tamanho de um côco ou até maiores.
As caminhadas pelo meio da mata vão se tornando cansativas pois as sementes -às vezes pesadas, às vezes dentro de frutas que também pesam- vão enchendo as mochilas. Em meio a isso, ir identificando e marcando as árvores capazes de ser boas matrizes.
A árvore ideal é aquela que está no ponto ideal, dispersando suas sementes, prontas para serem colhidas ou simplesmente pegadas no solo.
“Muitas vezes é uma disputa com animais, cotias, por exemplo, que também querem as sementes para sua alimentação e nós temos que ser mais espertos e ágeis para não perder uma semente”.
Os habitantes da selva
A região não é habitada por índios, mas as expedições são sempre a locais em que há aldeias de habitantes com sua vida extremamente simples, que vivem ali rusticamente há anos a anos.
“O senhorzinho que nos guiou na expedição que contei, tem seus 60 e poucos anos. Nasceu ali, ele e sua ente sobrevivem com alguma coisa que plantam, com a pesca, com algumas idas eventuais à cidadezinha mais próxima pra comprar alguma coisa. Muitas vezes é praticado o chamado “escambo” em que troca o que colhe na mata, seja cultivado por ele -na maior parte das vezes macachera, (ou mandioca, ou aipim, dependendo de como se chame a raiz num lugar ou outro do país) , sejam frutos ou peixes por coisas como arroz, feijão, por exemplo” – conta Rodrigo.
Problemas práticos
Entre os objetivos das expedições é identificar e sinalizar as melhores árvores matrizes. Sinalizar com a fixação de uma placa com as características da matriz, sua localização determinada por GPS. Ao mesmo tempo, treinar os habitantes locais para colher as sementes, acondicioná-las e indicar de que árvore foi colhida simplesmente copiando os dizeres da placa e assim ter mais um produto para seu escambo. Problema: os “mateiros” não sabem ler. Uma das alternativas que estão em teste é fazer a identificação não por texto, mas por cores.
Planos pessoais
O ar de Rodrigo quando fala de si, de seu trabalho, de seus planos de vida, é um ar de pessoa de bem com a vida, que conseguiu encontrar o seu caminho dentro do conceito Bom, Belo, Benefício e, mais do que isso, sente que a Proposta de Paz que o mestre Ikeda sempre prega está sendo plenamente alcançada.
Se já voltou ao Japão? Sim, uma vez e não está fora de cogitação ir mais vezes, mas para ver a família, matar a saudade dos pais e da irmã e voltar.
“Minha vida é aqui” -diz.