A floresta é muito mais que madeira

Flores
Como as mudanças climáticas impactam os produtos florestais não madeireiros da Amazônia

As plantas e suas flores, sementes e frutos são produtos de extrema relevância na economia da Amazônia porque mantêm a floresta em pé, ou trocando em miúdos: não resulta em árvores no chão para a extração de madeira. Conforme discorre Diego Oliveira Brandão[i] em seu artigo Mudanças climáticas e seus impactos sobre os produtos florestais não madeireiros na Amazônia, esses produtos florestais não madeireiros (PFNM) são típicos de atividades sociais e econômicas de indígenas, ribeirinhos e agricultores locais que fazem o extrativismo na floresta e o cultivo de espécies nativas em sistemas agroflorestais. Trata-se do meio de subsistência de toda uma população que, além de preservar a floresta, tira dela seu sustento e de toda a sua família. Infelizmente, os efeitos das mudanças climáticas sobre os PFNM e os meios de subsistência de comunidades dependentes da floresta ainda são pouco compreendidos na Amazônia.

Neste artigo, o pesquisador investiga os impactos das mudanças climáticas sobre os PFNM apresentando suas observações. Ele inicia discorrendo sobre a concentração de dióxido de carbono na atmosfera (CO2), a temperatura global, o déficit de pressão de vapor de água na atmosfera, as secas, os incêndios florestais e o desmatamento podem impactar as plantas que fornecem PFNM na Amazônia.

Discute também as tendências na composição de espécies e faz uma conclusão indicando as regiões onde os extrativistas e agricultores estão mais ameaçados pelas mudanças climáticas na Amazônia. As espécies com frutos altamente empregados na economia da região são: açaí (Euterpe oleracea e E. precatoria), andiroba (Carapa guianensis), buriti (Mauritia flexuosa), bacuri (Platonia insignis), cacau (Theobroma cacau), castanha (Bertholletia excelsa), cupuaçu (Theobroma grandiflorum), pupunha (Bactris gasipaes), taperebá (Spondias mombin) e ucuúba (Virola surinamensis). O artigo enfatiza que o efeito do dióxido de carbono (CO2) pode favorecer o extrativismo e o cultivo de espécies nativas em sistemas agroflorestais na Amazônia.

Cupuaçu Theobroma Grandiflorum

Ele explica que devido ao aumento anual na emissão de CO2 entre 2002 e 2011, favoreceu o aumento da taxa de fotossíntese, favorecendo a formação de flores e, em consequência, frutos. Em outra mensuração de um período mais longo na floresta tropical do Panamá, entre 1987 e 2014, foi associado ao aumento médio de 3% de floração. Portanto, a elevação do CO2 tem sido positiva para a formação de flores e frutos em ecossistemas naturais e na agricultura, mas pode ser limitada por variações climáticas e nutricionais.

Uma maior produção de flores e frutos causada pelo CO2 pode estimular mais carboidratos, lipídios e proteínas vegetais em PFNM para uso econômico na Amazônia. Por exemplo, as flores da espécie jambu (Acmella oleracea) são utilizadas por populações locais e empresas como alimento, fármaco e cosmético.

Especificamente sobre o impacto do aquecimento global na distribuição geográfica e produtividade de plantas na Amazônia: o que foi verificado é que a temperatura global na superfície do solo entre 2011 e 2020, vem aumentando de forma preocupante. Foi registrado um aumento entre 1,34 e 1,83°C mais alto em comparação à média do período entre 1850 e 1900 (IPCC 2021).

O pesquisador alerta sobre as estimativas para a Amazônia. Estas apontam que 30% de todas as espécies de árvores e 47% de toda sua abrangência geográfica serão reduzidas até 2050 pela combinação entre mudança climática e desmatamento. Isso causará um impacto significativo na vida de extrativistas e agricultores. Pois, com o aumento da temperatura global, cresce junto a demanda da atmosfera por evaporação; somado ao crescimento exponencial da taxa de transpiração das plantas que resulta em mudanças biofísicas em mais de 80% das espécies vegetais. É a principal mudança climática de efeito negativo sobre a produtividade observada na Amazônia.

As regiões amazônicas do sul e leste são as mais susceptíveis aos incêndios devido às menores taxas de precipitação (chuvas) e ao comprimento da estação seca em relação às regiões norte e oeste da Amazônia. O calor dos incêndios lesiona as raízes, troncos e copas, podendo levar à morte da planta. Queimam também os frutos e sementes dispersos pela vegetação que podem ser regenerados, coletados ou comercializados. A mortalidade das árvores após incêndios tem relação com as características morfológicas das espécies, porque as espécies com periderme (casca) mais fina são intolerantes ao fogo e suas populações reduzem onde os incêndios são frequentes (Barlow e Peres 2008). Isso indica que os incêndios florestais são ameaças maiores à diversidade de PFNM em municípios nas regiões sul e leste da Amazônia brasileira. Diego encerra enfatizando que “novos estudos são importantes para compreender como as espécies típicas da Amazônia e no bioma Cerrado são impactadas com as mudanças climáticas”.

Artigo original, publicado pelos Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE): http://mtc-m16c.sid.inpe.br/ibi/8JMKD3MGPDW34P/45U3UDP

[i] Biólogo com bacharelado pela Universidade Estadual de Montes Claros (2004-2009) e mestrado em Biodiversidade (Ecologia) pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA (2009-2011). Atualmente é aluno de doutorado em Ciências Ambientais (Ciência do Sistema Terrestre) no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE (2018-2022). Trabalha e estuda cadeias de produção extrativista, florística do Brasil e restauração florestal da Amazônia. É também  Biólogo Responsável Técnico pela Consultoria Amazônia Socioambiental.